Às vezes é difícil sair da cama. Abrir os olhos e pensar em como e onde encontrar forças para vencer mais um dia parece ser algo quase impossível. Sob a névoa da depressão, a tarefa diária não é apenas tediosa, pode parecer sem propósito. Mover-se através de rotinas é uma luta muito grande!  As coisas felizes parecem mudas e foscas, não dá para enxergar quase nada, e as más notícias soam ainda piores. A depressão afeta como as pessoas se sentem e veem o mundo ao seu redor e também pode mudar a forma como elas pensam. Parece que o mundo vai perdendo as cores ficando cada vez mais escuros.

Carrie Holmberg, uma pós-doutoranda em psiquiatria e ciências comportamentais da Universidade de Stanford que estuda o transtorno de humor relatou que atende muitos pacientes que se queixam de problemas de memória. Ela diz que alguns pacientes enfrentam problemas para encontrar as chaves ou lembrar informações de livros que leram a pouco tempo. Ela diz: “As pessoas muitas vezes apontam para simplesmente não serem capazes de funcionar bem”.

Esses relatos refletem exatamente o que muitas pesquisas vem mostrando,  que a depressão pode afetar a memória e a cognição de maneiras diversas e surpreendentes, o que pode gerar ainda mais uma sensação de frustração e incapacidade nas pessoas que sofrem com a depressão.

As pessoas deprimidas têm dificuldades em lembrar detalhes de eventos que vivenciaram. Experiências gerais, como férias por exemplo. Esse evento vêm à mente com facilidade, ou seja, não precisamos de esforço para lembrar delas, mas a dificuldade é lembrar de eventos específicos que aconteceram durante as férias como um almoço agradável em família, uma situação engraçada ou um passeio divertido. A memória prospectiva das pessoas, ou a lembrança de realizar uma atividade planejada no futuro, também sofre com a depressão. É muito mais difícil lembrar de devolver um livro da biblioteca ou tomar uma medicação diária.

Mas embora os detalhes e a memória prospectiva sejam afetados, as pessoas deprimidas não têm problemas em lembrar memórias ruins, pelo contrário, essas memórias estão acesas o tempo todo.  Daniel Dillon, professor assistente de psiquiatria da Universidade de Harvard, diz que pessoas saudáveis e não deprimidas geralmente têm uma memória melhor para eventos positivos em relação aos neutros ou negativos. Dillon diz: “Enquanto isso, as pessoas deprimidas têm uma lembrança mais forte de memórias ruins. “Em pessoas deprimidas, as pessoas pensam que a memória negativa melhora, mas, na verdade, o viés positivo diminuiu. Isso é óbvio para as pessoas e mais óbvio na entrevista clínica – você tem essa lembrança negativa dominante”.

Em 2014, os pesquisadores examinaram a cognição negativa em pessoas que anteriormente tiveram depressão e em um grupo que nunca tiveram. Pessoas que já tiveram depressão apresentaram mais facilidade em lembrar adjetivos negativos de uma seleção de palavras do que o grupo que nunca tiveram. Em 2007, cientistas conduziram uma pesquisa e examinaram o papel da memória positiva na regulação do humor. Eles descobriram que o humor das pessoas com depressão piorava quando elas eram encorajadas a recordar memórias felizes. O resultado foi diferente para as pessoas que tiveram depressão no passado, quando elas se lembraram de memórias felizes, o humor delas não teve nenhuma alteração.

O cérebro pode revelar algumas pistas sobre o domínio da depressão sobre a memória.  A área do cérebro que lida com aprendizado e memória chama-se hipocampo. É uma área sensível ao estresse e tende a ser menor em pessoas com depressão. “O volume diminuído do hipocampo pode explicar a má memória”, diz Dillon. Além disso, os pensamentos ruminantes característicos de quem sofre com a depressão,  podem dificultar a concentração das pessoas em outras tarefas. A ruminação, ou fixação em situações ou eventos perturbadores, ocupa recursos neurais que o cérebro poderia gastar em outras coisas, como memória.

Essas descobertas podem não fornecer o quadro completo. Um pequeno hipocampo não explica o componente emocional dos problemas de memória. “Não há razão para interromper apenas memórias positivas”, explica Dillon. 

Além disso, algumas pessoas propensas à depressão podem ter hipocampos menores antes de desenvolver a doença. “Ainda temos uma compreensão funcional pobre do que está acontecendo com a memória e a depressão”, diz Dillon.

Fora do laboratório, Holmberg diz que médicos e psiquiatras que trabalham com pacientes no lado clínico estão começando a discutir memória e problemas relacionados à memória com seus pacientes. “Os pacientes estão muito conscientes das deficiências cognitivas. Acho que os médicos estão cada vez mais conscientes. Normalizar e validar essa parte da depressão é importante, então não é tão assustador”, diz Holmberg. Essas discussões com os pacientes são importantes. De acordo com Holmberg, os antidepressivos podem efetivamente reduzir a tristeza, mas não são tão bem-sucedidos em direcionar os aspectos cognitivos da depressão – mesmo quando os pacientes se sentem melhor, eles ainda apresentam déficits nessas áreas.

“Melhorar o humor é importante”, diz Holmberg. “Mas queremos ter certeza de que reconhecemos que há limitações para o quanto isso faz, para que as pessoas não estejam lutando com o que sobrou por conta própria.”

Esses estudos nos fazem refletir o quanto é importante saber lidar com pessoas que sofrem com a depressão. Não é simplesmente dar conselhos achando que está ajudando sendo que, na verdade, acaba piorando a situação. Não adianta falar um simples “pense positivo” e achar que isso resolverá o problema. Ao invés disso, mostrar empatia, ter paciência e se mostrar disposto a ajudar, são atitudes bem mais eficazes. E embora a depressão possa causar além de outros danos, uma memória prejudicada, nunca se esqueça de buscar ajuda para você começar a ver  e viver o mundo de maneira mais positiva.